sábado, 21 de novembro de 2009

A Grande Cidade


«Ó Zaratustra!, é esta a Grande Cidade; aqui nada tens que procurar, mas tudo a perder.
Porque havias de querer chafurdar neste lodaçal? Tem piedade dos teus pés! Cospe antes à porta da cidade, e segue o teu caminho.
Aqui é o inferno para os pensamentos dos solitários; aqui os grandes pensamentos são cozidos vivos e reduzidos a papa.
Aqui apodrecem todos os grandes sentimentos; aqui apenas são autorizadas as crepitações dos sentimentos miúdos já completamente ressequidos.
Não sentes já o cheiro dos matadouros e das tascas do espírito? Não exala esta cidade um vampor de espírito trucidado?
Não vês as almas pender como farrapos moles e sujos? E desses farrapos ainda fazem jornais!
Provocam-se mutuamente sem saber porquê. Excitam-se uns contra os outros sem saber porquê. Chocalham as suas letas, fazem ressoar o seu ouro.
Sentem frio e procuram aquecer-se com aguardente. Têm calor e procuram o contacto fresco dos espíritos gelados; estão todos doentes, estão todos contaminados pela opinião pública.
É aqui a pátria de todas as concupiscências e de todos os vícios.»

Friedrich Nietzsche
in "Assim Falava Zaratustra", Guimarães Editores (2004).

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